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Crítica | Matrix Resurrections

Não é sobre ser mais rápido do que as balas de revólver! Na era de ressuscitar histórias de sucesso, chegou a hora de entrarmos novamente na Matrix, e, infelizmente, é isso que acontece. A diretora, Lana Wachowski, pegou toda sua filosofia e, com muita honestidade, deboche e autocrítica, resolveu colocar o público para pensar de novo, de um jeito nada sutil.

Logo no trailer de Matrix Resurrections já podemos observar Neo tomando a pílula azul e entender que o personagem está mantendo sua mente presa no universo criado pela Matrix. Ao longo do filme, várias das nossas dúvidas são respondidas – daquela forma que envolve explicações de programação, mas o fato é: estamos na Matrix e tudo parece um Déjà-vu, já vimos tudo aquilo, mas agora está diferente.

Sobre a história

Thomas Anderson é o game designer mais famoso do mundo, tendo criado um jogo que mudou a indústria: Matrix. Após o sucesso da trilogia, ele afirmou que não faria mais nada do universo e agora trabalha num jogo chamado: Binary (binário). No entanto, seu chefe foi intimado pela empresa para fazer uma sequência, que iria existir com ou sem ele. Aqui temos a primeira crítica sincera de Wachowski – nominalmente a Warner Bros – trazer a saga de volta não foi uma escolha sua, e o capitalismo iria mexer na sua história de vida com ou sem a sua participação.

Após parar de tomar o medicamento receitado pelo seu analista, brilhantemente interpretado por Neil Patrick Harris, Thomas Anderson começa a questionar se o jogo Matrix foi uma criação sua, da sua fértil e perigosa imaginação, ou se são lembranças que tentaram ressignificar de alguma forma.

 A trilogia de Matrix colocou as irmãs Wachowski como referência da ficção-científica e o filme permanece atual com suas críticas e filosofia existencialista. No entanto, essa é uma história que vai além das características que associamos a ela: como as clássicas cenas dos personagens desviando de tiros – e, esse estigma parece diminuir a mensagem que as diretoras queriam trazer – e, aqui, Wachowski crítica esse aspecto da cultura pop.

 Matrix Resurrections, estruturalmente, remonta ao primeiro filme e temos, sim, a sensação de estarmos tendo um Déjà-Vu, como a primeira cena nos aponta. Apesar disso, o filme não é um remake e tão pouco um reboot, é uma história pessoal carregada de críticas sobre a antítese que vivemos: nós tomamos a pílula vermelha, aprendemos a libertar nossa mente e sair da matrix, mas parece que escolhemos permanecer controlados – agora estamos na matrix por vontade própria.

Foto/ Divulgação – Warner Bros Pictures
Temas retratados 

 Wachowski sempre trouxe discussões contemporâneas relevantes, antes mesmo das pessoas estarem dispostas a conversar sobre tais temas: como o paralelo de matrix e o transgênero – de como a vida não é binária, por mais que as pessoas coloquem tudo dessa forma.

Aqui a diretora e os demais roteiristas falam sobre como a escolha é uma ilusão. De forma nada sutil, fazem inúmeras referências, principalmente a Alice através do Espelho – história “continuação” de Alice no País das Maravilhas, amplamente referenciada na trilogia anterior e que questiona justamente as barreiras de sonho e realidade.

 Além disso, Matrix Resurrections questiona o nosso apego ao nostálgico. Nossa necessidade de revisitar e recontar de novo e de novas histórias que já tiveram o seu fim, como está aqui. Wachowski faz as perguntas difíceis que fechamos os nossos ouvidos todos os dias. E tal qual o primeiro filme, nos tira de um lugar confortável e nos apresenta a realidade dolorosa que precisamos encarar. Ou podemos, ainda, ignorar a mensagem de toda franquia de filmes e nos concentrar apenas nas cenas espetaculares de ação que esse filme também proporciona!

Elenco

 Encontrar Keanu Reeves e Carrie-Anne Moss como o casal protagonista da história de amor cyberpunk é sempre um deleite. A história se apega bastante ao sentimento que já criamos com os personagens. Apesar de apresentar flashbacks dos filmes anteriores, eles não são suficientes para reacender nossa memória. O longa exige que tenhamos, de forma geral, a história anterior na cabeça. Mas, o olhar entre Neo e Trinity é algo que permanece em nós, mesmo após todos esses anos.

Foto / Divulgação – Warner Bros Pictures

 Aqui, a equipe é incrementada com novas adições ao elenco. Temos Yahya Abdul-Mateen II como Morpheus, uma recriação do mentor de Neo num estilo fanboy do personagem, simplesmente genial e excelente alívio cômico.

O destaque, no entanto, vai para Jessica Henwick como Bugs, personagem aparentemente não-binária e que irá conduzir a nova geração para o universo da Matrix. Uma inspiração, forte, teimosa e, principalmente, uma pessoa com fé na humanidade – a heroína que precisamos atualmente. Quem já viu Jonathan Groff como vilão sabe do potencial do ator e colocá-lo como Smith foi uma das melhores decisões de elenco!

Vale a pena ver?

 Matrix Resurrections é algo difícil de explicar. Cheio de sentimentos, críticas e deboches em relação a nossa sociedade, um humor que esconde certa amargura, desapontamento com a humanidade, e, claro, esperança.

O filme passa a sensação de Déjà-Vu com a estrutura semelhante e a recriação de várias cenas icônicas do primeiro longa. Contudo, tal qual a sua tecnologia altamente aprimorada, com cyborgs e robôs pets incríveis incluídos, o longa atualiza a sua mensagem sem perder a essência filosófica explícita.

Por fim, como uma legítima obra Wachowski, o amor é a maior esperança, a força com potencial de salvar a humanidade. Mas, para isso, precisamos encarar a realidade e libertar nossas mentes. Você está disposto a tomar a pílula vermelha de novo?

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